Solilóquio

- É tipo andar de patins. - afirmou de repente.
Não entendi. Observei-o por um instante enquanto ele dava um outro gole na sua fanta maracujá (sério), pensei muitas coisas sobre ele. Não lembro que coisa. Não deviam ser importantes.
- É como se eu não soubesse andar de patins, mas de repente estivesse usando patins. - continuou, depois de baixar a garrafa. - De repente eu estou usando esses patins pra todo canto, e não posso tirar de jeito nenhum. Daí ele segura a minha mão. Pra eu não cair, entende?
- Sei. - disse. Não sabia. Não entendia porra nenhuma, mas achei que devia deixar ele falar.
- Eu não consigo andar de patins sozinho ainda, mas quando ele segura na minha mão eu consigo tranquilo estar em cima daquelas rodas e até me arrisco.
- Como se ele te desse apoio... - tentei, pra concretizar a metáfora.
- Isso, mas não exatamente. Ele não me carrega, eu nem me apoio nele de verdade. - tornou, e então fez uma pausa. Olhou para fora, pela janela. Dava pra ver os paralelos acontecendo na cabeça dele. - Eu só fico tranquilo de saber que se eu cair ele me segura.
- Certo. Então tá tudo bem, não é?
- Não, por que assim que ele solta da minha mão eu lembro que não sei andar de patins. E caio. Caio feio. - Me olhou. Coçou a mão direita. - As vezes caio de nem conseguir levantar.
Não respondi.
- E parece que ele não nota. Quando volta, me põe de pé de novo, me dá a mão e me faz andar nesses malditos patins. - Parecia acuado. Disse, para a porta: - E eu acho bom, por que ele tá lá e eu fico seguro.
- Então tá na hora de aprender a andar de patins sozinho, né? - Falei, querendo encerrar a conversa. Por algum motivo, aquilo tudo tinha me incomodado o bastante para que eu tivesse vontade de ir embora.
- Acho que não tenho aptidão. Acho que vai demorar.

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