O seu próprio vídeo pornô
Glorinha um dia pegou seu pai vendo pornografia. Seu pai, quem diria. Depois disso, nunca mais teve apetite sexual. Passou a adolescência sem dar um beijo sequer. Na fase adulta experimentou uns amassos mas nunca chegou a fazer nada realmente sensual. Passou por psicólogos, terapias em grupo, cafajestes e príncipes encantados, e nada parecia colaborar com o tardio despertar sexual.
Dona Glorinha, hoje, aos 79 anos, fica imaginando, no longo tempo que passa nos assentos preferenciais dos ônibus ou no curto tempo que passa nas filas preferenciais dos bancos, todas as outras pessoas nuas. Como serão os peitos daquela senhora perto da porta de trás do coletivo, aquela que está com um bico-de-pato prendendo mal o cabelo crespo e começando a ficar grisalho? Como será a bunda do adolescente que olha pra ela cobiçoso na fila comum do banco, será que já tem pêlos? Será que terá, um dia? Ou o peito peludo amostra na camisa aberta do grosseirão que entra no ônibus, como será o restante? Será que aquela moça de vestido branco dá muito?
Quando não basta imaginar as outras pessoas nuas, Dona Glorinha imagina essas mesmas pessoas fazendo sexo. Combina-as entre si, as vezes em casais hetero, as vezes - apenas pela diversão do desconhecido - em casais homossexuais. O nerd de óculos quadrado pegando de jeito a patricinha de unhas cor-de-rosa, a senhorinha de bolsa florida e a garota adolescente que masca chiclete com a boca aberta, o bigodudo de óculos escuros e o moleque com cara de meliante... se a imaginação corre solta, ela chega mesmo a fechar os olhos e se imaginar com algumas dessas pessoas, homens e mulheres, individual ou coletivamente, e pode jurar que chega a sentir fisicamente o que o cérebro processa furiosamente. Contrai os lábios, segura a barra da saia com alguma força. Se perguntam, não estava passando muito bem e ia ao médico em seguida. Sempre.
Volta para a casa todos os dias, faz um chá de camomila, deita no sofá e assiste o Vale a Pena ver de novo. Nesse meio tempo, sempre dorme e, nos sonhos, reprisa as melhores partes.
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