Nove horas

O senhor José Oithoemeya Santos era um tanto quanto paranóico sobre sua pontualidade. Ele tinha tamanho terror de se atrasar para qualquer tipo de compromisso, que preferiria morrer a, por exemplo, perder a consulta do dentista. Por tamanha neurose, o senhor José adiantava seu relógio em, no mínimo meia hora.
Antes tarde do que nunca o escambau.
Acordava quando os galos ainda sonhavam com galinhas bonitonas, saia de casa muitas vezes antes do primeiro ônibus imaginar passar no ponto, e reclamava da demora como se fosse absolutamente normal estar tão cedo na rua por livre e espontânea vontade e, ainda por cima, sem estar bêbado. Sua vida era uma correria louca e o desespero do atraso o perseguia toda hora, em cada canto que fosse, lá estava o suor frio e a dor de barriga característica que diziam claramente "sou doido de pedra".
No dia do seu casamento, chegou tão absolutamente cedo à igreja que, inconsciente do adiantamente proposital, imaginou que a mulher tivesse desistido e que nunca chegaria. Entrou em depressão súbita caiu de joelhos no altar implorando a Deus e à santo antônio, além de outros santos que ele acabara de conhecer na igreja, que sua mulher aparecesse logo. Rezou quarenta ave-marias, trinta pais-nossos, fez promessa, disse que se ela aparecesse ele comeria uma rosa na frente de todos os convidados e daria o dinheiro da gravata para um orfanato do bairro.
Eles não tiveram lua de mel por falta de renda e ele até hoje não esquece do sabor adocicado da flor.
Multas de trânsito pululavam nas gavetas de casa, chegavam com freqüência pelo correio, nem ele sabia para quem mais transferir os pontos. Pensou até em andar de biscicleta, econômico e ecológico, mas sua mulher o impediu imaginando o marido voando demente pela Anhangüera achando-se atrasado e sendo morto por uma cegonheira qualquer, que nem se daria pelo estrago que faria no pobre homem.
Mas a vida de José se resolveu na sua operação do cérebro. A mulher tinha ido viajar para o Piauí quando ele subitamente descobriu possuir um tumor no encéfalo. não chegou mesmo a avisar a mulher. Haveria uma cirurgia daqui a três dias, as nove e meia da manhã.
Foi dormir tranquilo, certo de que tudo correria bem (o médico era de extrema confiança e habilidade), e não contou com a desgraça do seu relógio estar com a pilha fraca.
O despertador não tocou e José, pontualmente, acordou as nove horas pra correr num taxi até o centro cirúrgico e viver pra sempre.
Mas o relógio parou justamente as oito da manhã e, para José, ainda eram oito e meia.
Um soninho a mais não mata.

Comentários

Daysinhaa disse…
muito bom *___*

eu nem tenho o que comentar direito, mas gostei muito muitoo s2
lucasreis disse…
Gostei bastante, djow!
Só tem uns pequenos erros de digitação, mas é coisa pouca, não tira a qualidade do texto. Ri logo no nome do cara.
Unknown disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse…
Foi-se o tempo em que eu avaliava mais os erros dos seus textos do que o contexto imbutido neles =P

Texto muito bem feito, meus parabéns, mey!
Um passo a mais para virar o colunista mensal do FN. (HHH)
Victor disse…
Mais um passo e ele estará virando é cronista da Veja, guarde minhas palavras (H)
Ah, tá ótimo como sempre \o/
Aliás, agora que prestei mais atenção, li o nome do cara e rialto.
Ocusteleta disse…
Muito Bom! Sem palvras, ficou otimo, até me lembrou eu uns anos atras saindo uma hora antes de casa pra fazer qualquer coisa com medo de chegra atrasado, depois isso mudou

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